“A Broken House” é um documentário dirigido por Jimmy Goldblum que retrata a história de Mohamad Hafez, um cidadão sírio que se mudou para os Estados Unidos em um visto de entrada única para estudar arquitetura e não pôde mais voltar para seu país natal. Enfrentando seu destino, canalizou a saudade de casa em seu trabalho artístico e começou a produzir esculturas em miniatuira de sua terra, construindo a "Damasco de suas memórias".
“Se você não pode voltar para casa, porque você não cria sua casa". Ao contar a história das pessoas que lá habitam, o projeto arquitetônico ganha uma dimensão política após o início da guerra civil síria, retratando a extensão da destruição sofrida pela cidade, humanizando os refugiados e compartilhando suas histórias.
O filme começa no ateliê do arquiteto, onde o protagonista está falando sobre o papel catártico e terapêutico da arte. “Quando saímos, deixamos de lado tanta coisa", declara o artista. A luta para fugir vem acompanhada de um conflito interno imerso em noções de derrota e perda. "Quando saímos, perdemos aniversários, casamentos, funerais ... deixamos de ter tanta coisa, de estar na vida um do outro", acrescenta.
Quando a guerra síria começou, Hafez, como muitos outros, começou a viver uma vida dupla, dividido entre duas realidades. Ele monitorava constantemente a situação em casa enquanto mantinha o rosto fechado e continuava com suas tarefas diárias. Se perguntando sobre o que poderia ser feito, ele canalizou suas emoções de fúria em arte decidiu traduzir o que estava acontecendo em arquitetura.
Perdas culturais e arquitetônicas
Ao invés de compartilhar imagens de cadáveres, já que, como Mohamad mesmo diz "quantos corpos você pode ver", o arquiteto representa uma realidade não filtrada em suas modelagens, para que pessoas consigam entender de maneira completa a dimensão da destruição, seja ela a destruição das vidas, de cultura ou de identidade. "A guerra síria foi coberta nos Estados Unidos se focando em imagens grotescas. A violência como uma maneira de construir empatia. Essa barragem de imagens horríveis foi um novo trauma para refugiados e imigrantes cujas histórias estavam sendo ostensivamente contadas. Eu gostaria de fazer um filme para essas comunidades, para dar espaço às suas tristezas, suas saudades de casa", explica Jimmy Goldblum, diretor do documentário.
"Se você quer varrer a história de uma nação, você destrói sua arquitetura". Nesse país destruído pela guerra, construções erguidas há anos e anos, desapareceram em fração de segundos. O ambiente construído que moldou geração após geração desapareceu com uma decisão desumana. A cidade, essa complexa mistura de camadas entalhadas em memórias coletivas, não estava mais de pé. Na prática, todos os legados que civilizações haviam deixado para trás, dissolveram, varrendo uma sociedade da existência.
Saudade de casa
Hiraeth, que era inicialmente o título do documentário, é uma palavra galesa que define um estado de saudade extrema de casa, a falta de um país que não existe mais, ou que nunca existiu, descrevendo um anseio profundo por algo que não está mais lá. O documentário explora a mistura complexa de um desejo, uma nostalgia melancólica, e um desejo intenso pelo passado, que normalmente vem com um entendimento não revelado de que o que esteve lá uma vez, não estará nunca mais, e que o ser desejante nunca terá seu objeto de desejo. Como o diretor coloca "o filme fala das maneiras complexas nas quais você está aprisionado longe de casa, suas memórias são tudo o que você tem; mas suas memórias podem ficar trancadas em um lugar, enquanto sua casa está evoluindo sempre".
Na verdade, a palavra "nostalgia", associada com um sentimento de perda e deslocamento, é também um romance com a fantasia de uma pessoa, de acordo com Svetlana Boym, professora Curt Hugo Reisinger de Línguas e Literatura Eslava e de Literatura Comparada na Universidade de Harvard. Relacionada à ligação entre a memória pessoal e coletiva, a nostalgia "tende a confundir seu lar de fato com um imaginário". Em outras palavras, as pessoas acabam romantizando uma realidade, se apaixonando por ideias e memórias que destacam em grande parte como elas se lembram ou imaginam as coisas. É agridoce. Essa interpretação subjetiva do que uma vez já esteve lá, se torna um conceito coletivo de uma diáspora que foi, de uma maneira ou outra, forçada a sair, mas ainda se mantém agarrada ao sonho de voltar para casa.
"O que quer que aconteça com todos, acontecerá comigo". A família, no filme, como tantas outras famílias do Oriente Médio, está espalhada pelo globo, e não se encontra sob o mesmo teto há muito tempo. As diferentes situações dos membros da família destacam uma luta universal enfrentada por residências separadas: a figura materna que não pode sobreviver fora de seu país, o filho que não tem a escolha de voltar, e o pai que se juntou à família no exterior mas não pode se dissociar da realidade de seu país.
O que faz um lar?
“Nada tem o sabor de casa”, declara a mãe de Hafez, uma vez que seu lar é negado, o apego da pessoa cresce. Isso começa a se manifestar em todos os detalhes, como em declarações que argumentam sobre a comida de casa ser a melhor. Será que é mesmo uma questão de comida, ou será que é porque a comida conecta as pessoas à ideia de casa? Mas o que faz um lar? A casa, mais do que um lugar apenas, é uma ideia emocional, muitas vezes associada com o ditado "casa é onde o coração está". Embutiva na consciência humana, a casa é relaciona às pessoas, às famílias, e às memórias. O lar nos juntas. O lar é o que conhecemos.
Adquirindo um significado ainda mais profundo em tempos de Covid, as noções de separação apresentadas no documentário e de um temporalidade indefinida, se tornam mais universais. "Aprisionado na América, Mohamad perdeu casamentos, funerais e aniversários por anos, e agora por causa da quarentena, aquele sentimento de anseio é algo com que todos podemos nos identificar", explica Jimmy Goldblum.
“Algumas pessoas, enquanto avançam pela vida, redescobrem o conceito de casa novamente e novamente; algumas pessoas nunca mais encontram uma casa após deixarem a sua; e, é claro, algumas pessoas nunca deixam o lar que sempre conheceram", declara Verlyn Klinkenborg em um artigo da Smithsonian Magazine. Na verdade, embora todos os humanos tenham diferentes atitudes em relação à vida, a noção de lar está sempre presente, e "A Broken House" busca jogar um holofote sobre o sentimento do que é desejar e sentir saudades de uma casa, da sua casa.
"Tenho saudade. Tenho saudade de casa.” conclui Hafez.
Confira abaixo a lista completa de prêmios e menções reunidas até agora.
- Pré-selecionado para o Oscar 2022 de "Melhor curta documentário"
- INDICADO: Cinema Eye Honors Honors, Melhor Curta de Não-ficção
- INDICADO IDA Documentary Awards de Melhor Curta
- PRÉ-SELECIONADO: DOC NYC Shortlist
- VENCEDOR: Palm Springs International ShortsFest | Prêmio do Público para Melhor Curta Documentário
- VENCEDOR: Palm Springs International ShortsFest | Prêmio Mozaik “Bridging the Borders”
- VENCEDOR: Flickers’ Rhode Island International Film Festival | Prêmio Júri de Melhor Edição
- VENCEDOR: RiverRun Film Festival | Prêmio do Júri de Melhor Curta Documentário
- VENCEDOR: Salem Film Festival | Prêmio do Júri de Melhor Curta Documentário
- VENCEDOR: SCAD Savannah Film Festival | Melhor Curta Documentário